NA ALTURA EM QUE ACONTECERAM AS DISSENSÕES EM CORINTO

JTP5NA ALTURA EM QUE ACONTECERAM   AS DISSENSÕES EM CORINTO

“Eu sou de Paulo, e eu de Apolos, e eu de Cefas, e eu de Cristo” – I Co 1,12

 

João Tomaz Parreira 

Os cristãos de Corinto, os membros da “igreja de Deus que está em Corinto”,  eram mulheres e homens que viviam agora separados para um propósito especial. Eram santificados em Cristo, no meio de uma cidade promíscua e depravada, de tal modo que, entre os gregos, “coríntio” significava “libertino”. Não obstante, de todas as cidades gregas que tardaram a aceitar ou rejeitaram mesmo o Cristianismo – no século III havia ainda resistências -, a Corinto cosmopolita foi a primeira e exemplar a servir e proclamar Jesus Cristo.

 

A necessária separação iria despojar os cristãos de Corinto, da natureza humana? Não. Paulo diz-lhes que não lhes pode “falar como espirituais, mas como carnais, como a meninos em Cristo”. Mais do que nos adultos, as dissensões estão no terreno da infância. Paulo trata deste assunto com um “terno apelo” – escreve um comentarista da Carta aos Coríntios, não deixa que prolifere o “espírito de facciosidade”.

 

A palavra “dissensão” é benévola na nossa língua, quando se   traduz por uma  diversidade de opiniões; na língua grega usada no Novo Testamento, porém, o vocábulo é mais possante porque acentua uma acção: ”Schismata” (do substantivo “Schisma”), que significa, rasgão, separação, mais extensivamente, dividir em partes. Palavras que traduzem a ideia de fenda na unidade. O que, segundo a lamentação, por assim dizer em forma de pergunta exortatória paulina, parece ser o caso.  

 

O quadro a que podemos aplicar a palavra “dissensão” ou cisma, que encontramos na comunidade cristã de Corinto, na altura em que aconteceram tais dissensões, revelam factos históricos concernentes a homens que tiveram ligações estreitas com a comunidade, sobretudo, Paulo e Apolo, incluindo à distância o nome de Pedro, pela dificuldade de alguns cortarem definitivamente com o judaísmo.

 

No tecido intertextual das fontes históricas sobre a Igreja Cristã no século I e o próprio texto epistolar de Paulo, todos os nomes de quem os “grupos” se reividicavam, é fácil perceber que os do “partido” de Cristo presumiam  ser os melhores crentes. Os presumidamente mais “espirituais” do que os outros irmãos.

 

O que tornava a situação menos problemática, era o facto de não haver ( Paulo não as denuncia) diferenças doutrinárias entre os “partidos”, divergências de opinião sobre líderes,  o ensino de Paulo não diferia do de Apolo. Tratar-se-ia apenas de preferências pessoais.

A questão, porém, subsiste: quem era o pastor da igreja, qual o seu nome? O que pela não referência nos dá a ideia de que não haveria nenhum apoiante nem “partido” desse hipotético pastor?

Estranho é, portanto, que Paulo não pudesse ter transmitido algum grupo do “actual” pastor, porque nada lhe disseram sobre isso?  Isto é, estranha-se que não houvesse um partido do pastor em actividade naquela altura.

 

Dos nomes Crispo, Gaio, Estéfanas ou alguém da família de Cloé, não se pode destacar um como sendo presumível pastor da igreja de Corinto.  Todavia, a probabilidade mais correcta, reside em podermos pensar que naquela altura das dissensões, a comunidade era dirigida por um presbitério/episcopado do qual fariam parte todos eles. Ou Tito Justo ? (Act  18, 7)

No que concerne a uma comunidade ser dirigida / servida por presbíteros, não seria novo nem inusual,  conhecemos a de Éfeso (Actos, 20, 17 e 28)

 

O historiador do Cristianismo Latourette considera mesmo que, em relação à comunidade cristã de Corinto e à sua estrutura eclesiástica,  Paulo nomeou “os oficiais da igreja”. (“Historia del Cristianismo”, Tomo I). O mesmo autor sugere o que parece ser a muito custo refutável,  que “a igreja de Corinto tinha vários presbíteros”. Assim, escreve: “ a igreja de Corinto não teve a superintendência de um bispo só, como tiveram as demais igrejas”.

 

Outras fontes externas à epístola paulina, como a chamada “Carta de Clemente Romano aos Coríntios”, (se este Clemente for o referenciado em Filipenses 4,3, uma vez que Eusébio de Cesareia e Jerónimo o identificam como tal) dizem-nos que houve agitadores que se amotinaram contra os presbíteros.

No capítulo 1, 1, e 6, lê-se: “Talvez estejamos a ocupar-nos com atraso dos acontecimentos que se deram entre vós, caríssimos, e daquela sedição estranha a eleitos de Deus ”, “(…) Tudo realizáveis sem acepção de pessoas, e andáveis nos preceitos de Deus, sujeitando-vos aos vossos guias, e tributando aos vossos presbíteros o respeito que lhes é devido.”

Clemente Romano escreveu que “toda revolta e todo cisma causam horror”, embora se saiba que, infelizmente, durante os primeiros três séculos alguns  cristãos promovessem cismas em torno da doutrina cristológica e da Teologia.  Noutro ponto da sua carta, deixa o recado que “Cristo pertence aos humildes e não aos que se elevam acima da grei” (16,1)Em relação aos “desordeiros” de Corinto que quiseram expulsar os pastores legítimos.

 

Seja como for, se diante da História do Cristianismo e das igrejas neo-testamentárias, nos resta leitura e suposições, diante da força e perpetuidade das Cartas de Paulo aos Coríntios, eleva-se a gratidão a Deus por tão sublime pensamento, e um silêncio, mas silêncio ensurdecedor sobre o que ensaiamos neste artigo.                                                                                       

A verdade é que gostaria de ter tido uma visão mais ampla, mas ainda assim não subi à varanda dos diversos comentadores bíblicos sobre o assunto. Penso sempre que, no que concerne a “ensaiar” um texto evangélico devem ser  as Escrituras a explicar as Escrituras.

                                                                                       – © João Tomaz Parreira